7.4.13

XXIII (Coqueluche)



  Eu conheci uma mulher e diziam as línguas que a história dela era essa.
  Pequena, Cristina morava numa casa menor que ela, uma caixa compressora de gente e sonhos, ficava um pouquinho além do pé do morro e ela morava com seus três irmãos, seu pai e sua mãe, apesar de na maioria do tempo as crianças ficarem sozinhas em casa, brincando em suas caixas de papelão, descascando a parede. Muita gente e pouco dinheiro – um dos filhos morreu – doía na mãe pensar que assim a vida poderia ser um pouco mais fácil... E essa é a vida que muitos levam.
  Aos sete anos, Cristina contraiu uma coqueluche, tossia sem parar, a tosse resvalava por entre as paredes de qualquer beco, qualquer buraco em que existia ou não vida. A mãe desesperada queixava por aquela praga, que além de ser a própria vida, também estaria embutida morte de todos os filhos? Nada dava jeito naquela tosse e não havia dinheiro para a vacina. O pai não aguentava mais, quando a tosse o perturbava muito, ele saia para beber. Depois de umas três semanas, após uma bebedeira, o pai irritado pega a cabeça da menina e começa a bate-la contra a parede até Cristina desmaiar. Foi uma gritaria, a mãe foi contra a princípio, mas quando viu a menina sem tossir, ela pode ser submissa sem sentir culpa. E as batidas contra a parede duraram quase um mês, todos os dias, até conseguirem um injeção num hospital público para a menina. A coqueluche passou, porém as pancadas deixaram sequelas profundas em Cristina; não era mais tosse que se ouvia pelo ar, mas uma voz estridente esquecendo-se das palavras, lábios caídos, olhos perdidos, desmaios, a menina foi a nocaute, uma demência e agora é para a vida.
  Seis anos depois o pai e outro irmão morreram, ficam apenas a mãe e a irmã mais nova para cuidar de Cristina, que desaprendeu a andar e se tornou para sempre aquela criança com sete anos, porém agora sem coqueluche... E essa é a vida que muitos levam.

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