30.4.13

XXVII

Tanto medo
E já entupi a válvula de escape.
Medo de cair, medo por mentir,
Preguiça.

Estar aqui já é um bom motivo para estar em pânico,
Por não saber o que há de grão e o que há de fogo entre um nada e a morte,
Apenas por não ser, por pensar nisso.

Eu não sei se ainda consigo escrever,
Ou o que será de mim,
E isso me dá medo.

25.4.13

XXVI

Talvez eu não seja bom o suficiente,
Talvez eu não seja eu o suficiente.
Inocuamente retiro-te um pedaço e te dou,
Restou o cheiro de tabaco pelos corredores
E um pouco de conforto em saber, em sentir-me aspirante
Ao o que não é dor.

Tem vezes que me torno turista do que nós vivemos,
Se por vezes utilizo um sentido dúbio
É por uma forma de anti-parasitar, antes de perdoar;
Então, o que existe se você não me tirar daqui?
O que quer que eu seja, talvez não é muito bem o que eu queria.
Já chegamos aqui, e já não tenho muito mais a dar;
A trovoada despiu os carrascos
Que ludibriaram o rei.

A aurora trouxe novas mentiras, novas selas;
Como os que sentem, o que menos tiver será retirado por completo.

Talvez não seja nada o suficiente -
Quanto há de vida, não há o que viver;
A culpa é minha para não perder os costumes
E paranóia.

19.4.13

XXV (Amor)

  Quero ter de volta as risadas por causa de brincadeiras que só nós entendemos e fazemos; pensarmos juntos o que faremos domingo de tarde; comermos o crepe do shopping e ficarmos aflitos com a demora; falar sobre Beatles de um jeito que só nós falamos; chorarmos juntos porque estamos tristes; nossos lábios em formato de boca de peixe para nos beijarmos; você me bater ao ver um fusca antes de mim; ficarmos lembrando nossos cinco meses juntos; os finais de semana com coca-cola; pastéis com bacon, linguiça, queijo; nossos abraços durante um dia; você correndo e pulando em cima de mim e nesse meio tempo fazendo uma cara engraçada; nós dois fazendo sonoplastia, eu com o baixo; dormirmos juntos e quando eu acordar durante a madrugada você estar me abraçando forte; dias e semanas sem brigas e paranóias; comermos no McDonald's por causa do monopoly; tirarmos fotos fofas juntos; aquele ciuminho bobo sem exageros; a paz em estar contigo; você me chamando e bipolar e eu falando que não sou e não preciso de tratamento; elaborarmos as desventuras do menino Daniel; nossos amassos quando estou indo embora da sua casa, quando estamos aqui em casa, quando estamos na rua, em qualquer lugar e em qualquer hora; discutirmos amigavelmente sobre fla-Flu; assistir Woody-Allen e outros filmes que prometemos de assistir juntos; nos chamarmos de noivorido/noivorida/noivorado/noivorada; você falar que meu coração está batendo forte e eu falar que ele está gritando - "VIVIANE", e você falar - "Que brega...", e rirmos; as suas cartas, as suas letras para mim; conversarmos sobre o Buk; escutarmos Brel juntos; ficarmos falando "gato" até vermos uma galinha na encruzilhada em frente ao meu prédio e começarmos a falar "galinha"; estarmos conversando sobre qualquer tipo de assunto e eu colocar o Pelé no meio desse assunto; ficar olhando suas fisionomias e achar engraçado a cara de esforço que você faz até para abrir um pote de azeitona; zoarmos a gordinha do cachorro-quente e o Fernandinho; irmos à um rodízio do etnia e não termos nenhum problema; uma noite na Lapa; irmos ao cinema, o cinema; - "Quer iogutti, bebê", - "Queloo..."; beijos e mais beijos, momô; disputar para ver quem ama mais; ver você comendo o biscoito japonês; sermos o casal que sempre fomos...

15.4.13

XXIV



Você sabe, eu fui ao banheiro apenas para acariciar o medo em meus olhos;
E a cada gesto eu perco minha pureza;
E por cada sílaba assaltada àquela noite,
Eu sinto falta de mim.

A avistei em mil faces,
Debandei pelos riachos que te formam;
Cadenciei nossos corpos
Em uma só alma.

Agora eu me sinto bem em saber que uma pessoa existe ao mesmo tempo que eu.

7.4.13

XXIII (Coqueluche)



  Eu conheci uma mulher e diziam as línguas que a história dela era essa.
  Pequena, Cristina morava numa casa menor que ela, uma caixa compressora de gente e sonhos, ficava um pouquinho além do pé do morro e ela morava com seus três irmãos, seu pai e sua mãe, apesar de na maioria do tempo as crianças ficarem sozinhas em casa, brincando em suas caixas de papelão, descascando a parede. Muita gente e pouco dinheiro – um dos filhos morreu – doía na mãe pensar que assim a vida poderia ser um pouco mais fácil... E essa é a vida que muitos levam.
  Aos sete anos, Cristina contraiu uma coqueluche, tossia sem parar, a tosse resvalava por entre as paredes de qualquer beco, qualquer buraco em que existia ou não vida. A mãe desesperada queixava por aquela praga, que além de ser a própria vida, também estaria embutida morte de todos os filhos? Nada dava jeito naquela tosse e não havia dinheiro para a vacina. O pai não aguentava mais, quando a tosse o perturbava muito, ele saia para beber. Depois de umas três semanas, após uma bebedeira, o pai irritado pega a cabeça da menina e começa a bate-la contra a parede até Cristina desmaiar. Foi uma gritaria, a mãe foi contra a princípio, mas quando viu a menina sem tossir, ela pode ser submissa sem sentir culpa. E as batidas contra a parede duraram quase um mês, todos os dias, até conseguirem um injeção num hospital público para a menina. A coqueluche passou, porém as pancadas deixaram sequelas profundas em Cristina; não era mais tosse que se ouvia pelo ar, mas uma voz estridente esquecendo-se das palavras, lábios caídos, olhos perdidos, desmaios, a menina foi a nocaute, uma demência e agora é para a vida.
  Seis anos depois o pai e outro irmão morreram, ficam apenas a mãe e a irmã mais nova para cuidar de Cristina, que desaprendeu a andar e se tornou para sempre aquela criança com sete anos, porém agora sem coqueluche... E essa é a vida que muitos levam.

2.4.13

XXII

Meu sapato preferido furou
E pedrinhas entram dentro dele,
Acabam me machucando.

Pela velocidade tivemos de pagar um preço bem alto,
O arroz não é mais como antigamente - disse-me ele.
Bem, não sou mais o mesmo que antigamente;
Sabes tudo: doravante as crises cessarão e pouco restará de mim.

Incógnita eu estar me tornando apenas lembranças.

Quem cospe não quer receber uma cusparada de volta.

Parei de querer encontrar qualquer mordida na razão.
Eles não têm sentimentos, mas ainda assim se matam como antigamente.