Nem todas as mulheres nasceram para ser mãe, minha mãe mesmo
não nasceu para ser mãe. Por dia perdemos um bom punhado de delicadeza, as
pessoas deveriam respeitar isso. Mulheres não deveriam perder-se em algum
canto.
O obstetra entregou
a criança em seu colo e lágrimas rolavam dos seus olhos, nos braços de Paula
estava seu filho e ela o detestou por ele ser preto. O pai da criança entrou no
quarto, e com o rosto assustado, Paula foi arremessando seu ódio:
- Seu merda, você me deu um filho preto! Bem que meu pai
dizia antes dele morrer: prefiro que você se case com um branco cachaceiro do
que com um preto rico! Você acabou com minha vida! Você e essa droga de
criança!
Nos dias que passaram no hospital, em nenhum momento Paula
deu leite ao menino, não queria ficar com ele e quando voltou para casa, a
criança foi no colo de sua avó materna.
Ao chegarem em casa,
algo de um vazio misturava-se ao ar, os sintomas de existência eram
perturbadores. As duas olharam-se – não
há nada tão desesperador em nosso tempo do que crianças:
- Mãe, eu não quero isso! – falou Paulo, com sofrimento –
Como poderei exibir isso pelas ruas?! Parece uma doença.
- Na hora que você viu aquela pica preta você não pensou
nisso! Tome vergonha na cara, Paula! Isso o que você diz com essa cara de nojo
é seu filho! Tenha dó, assuma essa criança! – respondeu sua mãe fervorosamente.
- Não, mãe, eu não posso. – Paula com os olhos baixos por
vergonha daquele filho – Fique com ele, cuide dele pra mim.
Então, a criança foi morar com sua avó. O pai depois de um
tempo foi embora. Mais uma vida destruída. A mãe envolveu-se com outros homens
e esqueceu-se do menino, ficou viciada em calmantes e outros psicotrópicos até
que chegou o dia em que foi afastada do seu trabalho por licença.
Após oito meses do nascimento do menino, Paula
foi finalmente visitar ele e sua mãe; a avó ficou feliz, aquele reencontro lhe
dava as esperanças de uma vida nova. Paula e o menino ficaram sozinhos no
quarto durante um bom tempo, quando a avó foi vê-los, ao ver a cena deu um
grito: Paula tirava a pele do menino com uma navalha e falava: “Olha mãe, estou
deixando o nosso menino branco.”.
Há doze anos
Meu marido me traiu
na rua, pegou AIDS e passou para mim e eu passei para nossa filha através do
meu leite. Vivemos juntos até hoje, tenho medo de ficar sozinha.
Pense que num lugar uma pessoa está se afogando
Enquanto uma pessoa está louca por saber que está grávida
E alguém é demitido.
Submersos num aquário de misérias,
Amarramo-nos em nossas dualidades;
E não nos aceitamos.
Você engana ou é enganado.
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